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A Alienação Fiduciária de Imóvel como Forma de Garantia do Crédito

A Alienação Fiduciária de Imóvel como Forma de Garantia do Crédito

Diante das inúmeras dificuldades enfrentadas pelos credores para a execução das tradicionais modalidades de garantias reais, como penhor e hipoteca, cada vez mais a alienação fiduciária vem sendo utilizada como forma de garantia de crédito, sobretudo a partir da crise econômica pela qual o País tem passado recentemente. Muitas dúvidas têm surgido, a partir disso, acerca da regularidade do emprego do instituto em determinadas operações.

Ainda desconhecida por muitos, a alienação fiduciária consiste em uma forma de garantia real pela qual o devedor de uma obrigação (fiduciante) transfere a propriedade de um bem ou direito para o credor (fiduciário), sob condição resolutiva, como forma de garantia do adimplemento da obrigação.

Trata-se de negócio jurídico de disposição condicional, uma vez que cumprida a obrigação, resolve-se a propriedade fiduciária e transmite-se a propriedade ao fiduciante. Com a constituição da propriedade fiduciária, o devedor torna-se o possuidor direto e o credor, possuidor indireto do bem.

Muito embora a alienação fiduciária de bens imóveis tenha sido introduzida em nosso ordenamento pela Lei n. 9.514/1997, que dispõe sobre o Sistema Financiamento Imobiliário, seu alcance ultrapassa os limites das transações relacionadas à aquisição de imóvel.

Da leitura do artigo 22, §1º, da Lei n. 9.514/1997  e do art. 51 da Lei n. 10.931/2004, resta clara a possibilidade de instituição da alienação fiduciária como forma de garantia para qualquer tipo de contrato, inclusive os de securitização de ativos.

¹ Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.
§ 1º  A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no SFI, podendo ter como objeto, além da propriedade plena:
I - bens enfitêuticos, hipótese em que será exigível o pagamento do laudêmio, se houver a consolidação do domínio útil no fiduciário;
II - o direito de uso especial para fins de moradia;
III - o direito real de uso, desde que suscetível de alienação;   
IV - a propriedade superficiária.
² 51. Sem prejuízo das disposições do Código Civil, as obrigações em geral também poderão ser garantidas, inclusive por terceiros, por cessão fiduciária de direitos creditórios decorrentes de contratos 

Os precedentes jurisprudenciais dos tribunais pátrios perfilam do mesmo entendimento:

STJ

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE NÃO DEMONSTRADAS. PRETENSÃO DE REJULGAMENTO DA CAUSA. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. [...] 4. A lei não exige que o contrato de alienação fiduciária de imóvel se vincule ao financiamento do próprio bem, sendo legítima a sua formalização como garantia de toda e qualquer obrigação pecuniária. 5. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 829.403/PR. Terceira Turma. Rel. Min. Moura Ribeiro. Data do julgamento: 19.10.2017)

TJSC

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE GARANTIA FIDUCIÁRIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DOS AUTORES. IMÓVEL OFERTADO COMO GARANTIA EM CONTRATO DE MÚTUO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. POSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIA QUE NÃO CARACTERIZA DESVIO DE FINALIDADE. DESNECESSIDADE DE VINCULAÇÃO AO SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO. INTELIGÊNCIA DO ART. 22, § 1º, DA LEI 9.514/1997 E DO ART. 51 DA LEI 10.931/04. PRECEDENTES NESSE SENTIDO. DECISÃO MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO, NOS TERMOS DO ART. 85, §11, DO CPC/15. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0300497-95.2016.8.24.0143, de Rio do Campo, rel. Des. Sérgio Izidoro Heil, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 04-02-2020).

TJSP

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de alienação de imóveis, por caução de direitos creditórios ou aquisitivos decorrentes de contratos de venda ou promessa de venda de imóveis e por alienação fiduciária de coisa imóvel.

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL – AÇÃO REIVINDICATÓRIA, C.C. DECLARATÓRIA – GARANTIA OFERTADA EM EMPRÉSTIMO BANCÁRIO PARA CAPITAL DE GIRO – OPERAÇÃO REPRESENTADA POR CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – POSSIBILIDADE EXPRESSA NA LEI 9.514/97 (Art. 22, § 1º) E NA LEI 10.931/2004 (Art. 51). Inexiste óbice para a convenção de alienação fiduciária de bem imóvel em mútuo bancário destinado a capital de giro, pois a Lei Federal 9.514/97 não está adstrita ao sistema financeiro da habitação, e a Lei Federal 10.931/2004, que regula, entre outras matérias, a cédula de crédito bancário, permite a constituição da garantia para as obrigações em geral. RECURSO PROVIDO. (TJSP;  Apelação Cível 1003360-50.2019.8.26.0004; Relator (a): Antonio Nascimento; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional IV - Lapa - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 03/10/2017; Data de Registro: 07/05/2020)

TJRS

APELAÇÃO CÍVEL. PROPRIEDADE E DIREITOS REAIS SOBRE COISAS ALHEIAS. CONFISSÃO DE DÍVIDA - MÚTUO - COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA FIRMADO ENTRE PESSOAS FÍSICAS. POSSIBILIDADE LEGAL. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL REGULAR. DESNECESSIDADE DE NOTIFICAÇÃO DO CONJUGE ANUENTE-INTERVENIENTE NO CONTRATO. ALUGUEL-PENA PELO USO DO IMÓVEL. SENTENÇA REFORMADA. ONUS SUCUMBENCIAIS REDIMENSIONADOS. - O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que é possível a constituição de alienação fiduciária de bem imóvel para garantia de operação de crédito não vinculada ao Sistema Financeiro Imobiliário ou vinculado ao financiamento do próprio bem, nos termos do que prescreve o art. 22, §1º da Lei nº 9.514/97. - Parte autora que realiza corretamente todo o procedimento extrajudicial da Lei nº 9.514/97 referente à alienação fiduciária, restando consolidada a propriedade em seu nome junto à matrícula do imóvel, de modo que deve ser acolhido o pedido de reintegração de posse do bem, nos termos da liminar já deferida. APELO PROVIDO.(Apelação Cível, Nº 70074687039, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Julgado em: 19-10-2017)

Ultrapassada a questão da legalidade da instituição da modalidade de garantia aos contratos em geral, passa-se a analisar os requisitos necessários para a caracterização da alienação fiduciária.

O contrato com instituição dessa modalidade de garantia real poderá ser formalizado por instrumento particular, devendo conter necessariamente, sob pena de descaracterização, os requisitos formais descritos nos artigos 22 a 27 da Lei n. 9.514/1997. Em função disso, deverão constar nesses contratos o valor da dívida a ser garantida, respectivos prazos, condições de pagamento, juros, encargos incidentes, entre outros.

O Contrato de Cessão, por si mesmo, não é hábil a instituir a garantia por alienação, mas nas situações em que posteriormente fique convencionado a recompra dos títulos ou em confissões de dívida o instituto poderá ser utilizado nos respectivos instrumentos.

Dentre as garantias reais, a preferência pela alienação fiduciária deve-se notadamente à facilidade da recuperação de crédito em comparação com as demais modalidades, como, por exemplo, a hipoteca e o penhor.

Pesa em favor da alienação fiduciária, a preferência na execução do bem, vez que, para essa espécie de garantia, não há concurso de credores, além do que todo o procedimento de resolução da propriedade independe de processo judicial.

Em caso de inadimplemento da dívida, é realizado o procedimento de consolidação da propriedade, em sequência, o leilão extrajudicial do bem, para que, ao final, o preço obtido com a venda sirva à satisfação da obrigação.

Percebe-se, por tais razões, que não existem óbices legais para a instituição da alienação fiduciária de bem imóvel como forma de garantia em algumas operações de securitização de ativos empresariais. Todavia, é sempre relevante a advertência quanto à necessidade de se atentar aos requisitos legais existentes para


³Art. 24. O contrato que serve de título ao negócio fiduciário conterá:
I - o valor do principal da dívida;
II - o prazo e as condições de reposição do empréstimo ou do crédito do fiduciário;
III - a taxa de juros e os encargos incidentes;
IV - a cláusula de constituição da propriedade fiduciária, com a descrição do imóvel objeto da alienação fiduciária e a indicação do título e modo de aquisição;
V - a cláusula assegurando ao fiduciante, enquanto adimplente, a livre utilização, por sua conta e risco, do imóvel objeto da alienação fiduciária;
VI - a indicação, para efeito de venda em público leilão, do valor do imóvel e dos critérios para a respectiva revisão;
VII - a cláusula dispondo sobre os procedimentos de que trata o art. 27.

formalização do negócio fiduciário, sob pena de o contrato não surtir os seus efeitos jurídicos.

 

Michel Scaff Junior
OAB/SC 27.944
Sócio da Menezes Niebuhr Advogados Associados
Advogado em Contencioso Cível para a recuperação de crédito.

 

 


Publicado em 03/08/2020 14:27:00

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